quando você nasce pra dar certo e não dá

quando você nasce pra dar certo e não dá, sempre tem alguém pra te lembrar o por quê. como se tivesse alguma coisa a ver com não gostar de brincar de boneca. como se fosse culpa de divórcio. ou de más influências. como se tivesse sentido culpar aquela minha amiga. como se tivesse sentido culpar.

ninguém nunca me culpou por trabalhar demais – só meu próprio corpo e meus terapeutas. ninguém nunca procurou em quem colocar a culpa das minhas conquistas profissionais. nunca sequer questionaram se havia uma razão pro meu jeito emoção de lidar com o mundo ao redor: eu sempre cuido pra que a vida seja mais leve. não tem culpa.

mas me culpam por gostar de acender um cigarro de manhã junto com o café. por ter largado cursos que não me faziam bem. por dizer não quando eu não quero. por querer ficar com quem me dá vontade de ficar, não importa onde. como se a gente tivesse escolha, sabe? como se a gente ficasse ponderando o que incomoda mais, só pra incomodar – e a gente pondera o que faz sentir melhor, e faz.

mas, se você nasce pra dar certo, você teoricamente não tem o direito de fazer o que faz sentir melhor. você tem direito de fazer o que tem que ser feito. casar, ter dois filhos, terminar a faculdade, fazer uma especialização, um mestrado, ser phD em alguma coisa. aí você não faz: não quer casar, não quer ter filhos, dane-se o academicismo. a minha pira é outra.

quero realizar: ver as coisas mudando de forma, a vida em movimento, os dias acontecendo um atrás do outro – sem pausas. eu gosto de quem acompanha. quem topa o vinho no copo errado, a cerveja na rua, a exposição no fim do mundo num dia aleatório, ficar junto pra não dormir. gosto de quem fica junto. essa é a minha pira.

e acho que nem tinha que ter medo envolvido nisso aí. nem vergonha. nem pé atrás. boto os dois pés na frente, com medo mesmo. na cara, nem vergonha nem maquiagem. limpa. lavada. indo, sempre. pra onde, eu descubro.

um dia alguém vai me dizer que lembra de um texto que eu escrevi um dia sobre não ter vergonha nem medo e eu vou falar que também lembro. porque eu tenho escrito esse texto a vida inteira. e ele nunca vai estar completo: eu não sou o que nasci pra ser – eu não nasci pra nada, porque eu nasci pro todo. e o todo é coisa demais pra acabar um dia. então tá bem: tragam os ossos do ofício, indiquem os palheiros que eu busco as agulhas, minha cara está pronta pros tapas e eu comprei peroba pra passar na minha cara de pau. deixo que digam, que pensem, que falem. manda a bola, eu rebato no peito. deixa a vida ser o que é. a minha é. sempre vai ser.


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